
Existem poucos filmes que já me deixaram incomodados até hoje. Nunca tive medo de filmes de terror e desde criança me fascino com eles. Então terror não é problema. Quanto à violência, ela é quase sempre estilizada nos filmes e também não me incomoda nem um pouco. Sobram então os filmes que fazem com que aquela sensação de conforto, de que se trata apenas de uma estória, vá por água abaixo. E esses, que trazem a angústia, são os que me incomodam significativamente. Mas não é aquele incômodo de não querer continuar com o filme. É um incômodo meio que fascinante no sentido da estranheza, da perplexidade.
Fazendo um exercício mental me lembrei de alguns filmes muito chocantes e que não saem da minha cabeça: são dois do diretor Gaspar Noé (Irreversível e Seul Contre Tous), Saló do italiano Píer Paolo Pasolini, Não Matarás de Krzysztof Kieslowski e o belga C'est Arrivé près de Chez Vous (já postado aqui nesse blog). “Desejo e Obsessão” já entrou para essa lista e penso que não sairá tão cedo.
A escolha do papel principal já promete antes de a película começar. Vincent Gallo. Ator, diretor, músico, escritor, fotógrafo, modelo e artista plástico odiado por muitos. Marginal em quase tudo que faz. Estereotipado como o charlatão que levou um filme ao festival de Cannes para chocar com uma cena de sexo oral explícito com a atriz (polêmica também) Chlöe Sevigny. Alguns o consideram narcisista, outros megalomaníaco (quando pode faz tudo no filme: atua, dirige, escreve, musica, ...) . Fato é que Gallo divide opiniões. Sua presença é promessa de polêmica.
Dessa vez Vincent Gallo se limita a atuar. E age de maneira marcante. É Shane, americano que decide passar a lua de mel em Paris. Não é o glamour da cidade que direciona a sua escolha e sim a possibilidade de resolver um problema. O ritmo lento da película compete com a angústia de Shane. Algo o incomoda diariamente. Um desejo secreto que lhe traz sérios problemas, assim como sugere o título original “Trouble Every day”.
Gosto sempre de não ler nada sobre um filme antes. Nem de trailers eu gosto. Aprecio a surpresa. O inesperado. Fico feliz em não saber antes qual o mote do filme e o motivo da angústia de Shane. A surpresa da revelação ao longo da película é muito bem delineada e faz o filme se tornar ainda mais interessante.
A direção de Claire Denis me lembrou a de Hal Hartley (diretor independente americano). Intervalos longos entre os diálogos e todos sem interrupção de terceiros. A música dos Tindersticks abre e fecha a cortina do pesadelo criado pela diretora.
O filme é uma obra de arte. Sublime, angustiante, perturbador. Muita coragem foi necessária para realizá-lo. Característica nunca em falta nos trabalhos de Denis e Gallo.
Não vou postar trailer e sim vídeo com a música:
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